O Supremo Tribunal Federal (STF) marcou para os dias 19 a 25 deste mês a retomada do julgamento que pode mudar as regras de demissão sem justa causa. O processo, iniciado em 1997, estava parado desde outubro do ano passado, após pedido de vista do ministro Gilmar Mendes.
Os ministros podem decidir se houve a incorporação da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) nas leis brasileiras.
Pela convenção, é obrigatório ao empregador, assim como no serviço público, justificar o motivo pelo qual está demitindo o empregado.
De acordo com a regra, a “demissão sem justa causa” seria proibida, como existe no serviço público. O dono do negócio seria obrigado a manter o empregado, ainda que não se enquadre no perfil do cargo que está exercendo.
A ação já tramita há quase 26 anos e discute a validade da denúncia da Convenção 158 da OIT feita por decreto pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, em 1997. A discussão é se a decisão teria que ser do Congresso.
Até o momento, quatro ministros já votaram: Dias Toffoli votou como na ADI 1.625 pela constitucionalidade do decreto; Edson Fachin votou pela inconstitucionalidade, sendo acompanhado por Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. Mas o processo ainda não foi pautado e depende do parecer do relator.
É esta ADI, que estava arquivada no gabinete do ministro Gilmar Mendes após um pedido de vista feito em outubro do ano passado, que será julgada na próxima semana.
Entenda o processo
No início deste ano, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) informou que circulou nas redes sociais e na imprensa que o STF iria proibir a dispensa sem justa causa.
Porém, de acordo com a juíza Eleonora Lacerda, da Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região do Mato Grosso, não é bem assim.
“De fato, o Supremo poderá julgar um processo que já vem se arrastando há mais de 25 anos. A pauta discute a aplicação de uma norma internacional que tem o poder de restringir as dispensas sem justa causa no Brasil.”
Na verdade, a magistrada explica que a convenção 158 da OIT foi ratificada pelo Brasil e entrou em vigor em 1996. Alguns meses depois, ela foi denunciada pelo então presidente da República, de forma que só vigorou no país por alguns meses.
Esta denúncia significa que, segundo FHC na época, não seria necessário aplicar a convenção. Por conta disso, houve questionamento na Justiça e o processo foi parar no Supremo Tribunal Federal, onde está até hoje.
A questão é se o presidente teria esse poder de simplesmente denunciar um processo que tramitou no Congresso Nacional, aprovado pelo Poder Legislativo, aprovado pelo Poder Executivo, tanto que entrou em vigor.
Portanto, nesta discussão, o Supremo dirá se poderia ou não ter sido feita a denúncia da forma como foi feita pelo então presidente.
Julgamento da ADIn 1.625
A Convenção 158 da OIT foi denunciada no plano internacional e o decreto 2.100, de 20/12/96, dando a entender que a norma deixaria de vigorar no Brasil.
Então, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), em junho de 1997, ingressaram com Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) no STF.
No pedido da ação, as partes alegam que a competência para resolver sobre tratados e atos internacionais é exclusiva do Congresso Nacional, e não do poder executivo.
Convenção 158
Segundo Carlos Eduardo Ambiel, advogado trabalhista e sócio do Ambiel Advogados, a Convenção 158 é baseada no princípio da justificativa. Significa que todo empregador tem que dizer porque está dispensando seu empregado.
Segundo a juíza Lacerda, o contrato de emprego é semelhante a um casamento.
“Imagine que você está casado há anos com alguém, está dando o seu melhor e, de repente, essa pessoa chega e fala que não quer mais saber de você e não oferece nenhuma explicação. A primeira pergunta que se faz é: mas por que você está indo embora?”
É isso que a Convenção 158 prevê: a obrigatoriedade de dizer o motivo pelo qual o empregador está pondo fim a este “casamento”.
A Convenção 158 nunca previu a possibilidade de estabilidade absoluta no emprego.
No Brasil, é isso que acontece hoje. O empregador pode dispensar o empregado arbitrariamente sem dizer o porquê. A Convenção 158 fala exatamente sobre isso. O empregador tem direito a extinguir o contrato de trabalho, mas deve falar o porquê está fazendo isso.
Ambiel esclarece que não precisa ser uma justa causa ou um motivo disciplinar, e nem é que só pode ser demitido por justa causa. A própria Convenção 158 fala que esses motivos podem ser em razão do comportamento, desempenho ou mesmo motivos financeiros e tecnológicos da empresa, por exemplo.
O advogado avalia que a própria lei trabalhista da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) protege mais o trabalhador do que a própria Convenção.
“As orientações da OIT são medidas, não são regras. A intenção é ter regras que protejam o trabalhador para não ser demitidos de ordens não justificáveis”.
Segundo ele, o Brasil já tem regras de proteção total, como o seguro de emprego, estabilidade para grávidas, acidentados do trabalho e, além disso, tem uma proteção compensatória.
“Se um trabalhador é demitido por decisão do empregador, ele tem vários benefícios que possam assegurá-lo por um período. Há o seguro desemprego, o saque do FGTS e a multa contratual de 40% sobre o valor do fundo.”