Na terça-feira (12), o novo ministro da Economia da Argentina, Luis Caputo anunciou um pacote fiscal com nove medidas para tentar conter a crise econômica que afeta o país. O anúncio foi gravado previamente e foi ao ar com duas horas de atraso. Não houve espaço para perguntas de jornalistas.
O ajuste foi chamado na imprensa de "Plano Motosserra", em referência à motosserra que Milei exibiu na campanha para presidente e que simbolizava o que o, à época candidato, queria fazer com os gastos públicos — cortá-los brutalmente.
O Banco Central da Argentina anunciará medidas relacionadas à política monetária, taxa básica de juros e dívida nesta quarta-feira (13).
Entre as medidas, estão:
1. Desvalorização do peso: US$ 1 passará a valer 800 pesos; hoje cada dólar vale 365 pesos. Isso inclui um aumento provisório do imposto de importações (chamado de "Pais", que incide sobre a compra de dólares) e dos impostos retidos na fonte sobre as exportações não agropecuárias.
2. Licitações: suspender novos editais de obras públicas e cancelar licitações que ainda não começaram.
3. Reduzir subsídio à energia e aos transportes: na prática, as contas de luz e gás aumentarão, assim como as tarifas de trens e ônibus em toda a região metropolitana de Buenos Aires.
4. Reduzir ao mínimo transferências às províncias.
5. Suspensão de publicidade do governo por um ano.
6. Cargos públicos: não renovar contratos de trabalho com menos de um ano.
7. Corte na estrutura do governo: reduzir 106 para 54 o número de secretarias, e os ministérios de 18 para nove.
8. Social: priorizar projetos sociais que não exigem intermediários e fortalecer programas como o que paga um auxílio a mães com filhos.
9. Substituir o sistema de importações para um que não exigirá informações de licença prévia.
Repercussão
O Fundo Monetário Internacional (FMI) elogiou as medidas e as tratou como "audaciosas".
O pacote era a medida mais esperada do novo presidente, Javier Milei, que, durante sua campanha, prometeu cortes profundos na estrutura estatal.
No discurso de posse, no domingo (10), Milei disse que "não há dinheiro" no país e pediu para que a população se preparasse para tempos difíceis antes de que a situação melhore.
Crise
A Argentina vive uma das piores crises econômicas de sua história recente, com 40% da população vivendo na pobreza e a inflação ultrapassado os 140% anuais. Milei tem dito que o corte dos gastos públicos será equivalente a 5% do Produto Interno Bruto (PIB) do país.
O porta-voz do governo argentino, Manuel Ardoni, já havia falado de "um forte corte fiscal", com foco nas receitas sociais, e afirmou que o pacote desenhado por Caputo e Milei tem como objetivo "evitar uma catástrofe maior".
Pela manhã, o porta-voz também anunciou que, durante um ano, todos os pronunciamentos do governo à imprensa serão feitos por vídeos gravados, que serão exibidos a jornalistas em uma sala da Casa Rosada sem possibilidade de perguntas.
Corte de ministérios pela metade
No domingo, logo após ser empossado ao cargo, Javier Milei assinou um decreto, o primeiro de sua gestão, reduzindo a nove o número de ministérios de seu país, a metade do que tinha seu antecessor, o ex-presidente Alberto Fernández.
Segundo Milei, a medida é a primeira para cortar gastos públicos, uma das bandeiras que ele levantou durante o discurso de posse.
Já na segunda-feira (11), em seu primeiro dia de trabalho à frente do país, Milei determinou o fim do home office no funcionalismo público e uma revisão nos cargos e contratos do governo.
Na reunião, que aconteceu na Casa Rosada, a sede do governo, Milei ordenou que os ministros adotem uma exigência de trabalho 100% presencial a todos os membros de suas pastas.
O presidente, segundo sua vice, Victoria Villaruel, também pediu um "inventário geral" de todos os funcionários públicos e cargos comissionados, além de um levantamento de todos os contratos vigentes nos ministérios.
Os anúncios geraram no país o temor de demissões e destituições em massa no funcionalismo público ao longo do dia, segundo a imprensa local.
Milei afirmou que, no curto prazo, a situação deve piorar até que as primeiras medidas comecem a dar resultado. E reiterou que o governo não tem dinheiro: "Lamentavelmente tenho que dizer, 'no hay plata'".
"Isso impactará de modo negativo a atividade, o emprego, a quantidade de pobres e indigentes. Haverá estagflação [situação em que há estagnação da economia e inflação alta], mas é algo muito diferente do que tivemos nos últimos 12 anos. Será o último gole amargo para começar a reconstruir a Argentina", disse.
"Não será fácil: cem anos de fracasso não se desfazem num dia, mas um dia começa, e hoje é esse dia."
O presidente argentino discursou nas escadarias do Congresso, para seus eleitores. Foi uma quebra de protocolo, porque normalmente esse discurso ocorre dentro do parlamento.
Mais tarde, já na Casa Rosada, falou ao público de novo e disse que sua eleição representa "o fim da noite populista e o renascer da Argentina próspera e liberal".
Entre as autoridades que participaram da posse estavam o ex-presidente Jair Bolsonaro e o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky. O presidente Lula não foi a Buenos Aires e mandou seu chanceler, Mauro Vieira, como representante do Brasil.
Inflação
No discurso de posse, Milei também mencionou a elevada inflação, acima de 140% ao ano, e atribuiu a culpa aos governos peronistas. Antes de Alberto Fernández, que deixou o cargo agora, quem governou foi Mauricio Macri, que é de direita e aliado de Milei. Antes de Macri, Cristina Kirchner.
"Arruinaram a nossa vida e fizeram cair dez vezes os nossos salários. Portanto, não deveria surpreender que estejam deixando 45% de pobres e 10% de indigentes."
"Os argentinos, de forma contundente, expressaram uma vontade de mudança que já não tem retorno. Não há retorno. Hoje enterramos décadas de fracassos e disputas sem sentido. Brigas que só conseguiram destruir o nosso país e nos deixar em ruínas. Hoje começa uma nova era na Argentina, de paz e prosperidade", afirmou.