Santa Catarina registrou, ao longo de 2023, 1.749 casos de violência física contra crianças e adolescentes, segundo dados do Ministério da Saúde, divulgados pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), que discutiu na semana passada este e outros cenários da infância e adolescência no maior evento científico da especialidade, em Florianópolis.
É como se, por dia, por volta de cinco crianças fossem agredidas. Em todo o Brasil, a média é de 196 casos por dia ao longo de 2023. Segundo a SBP, cerca de 80% das agressões contra crianças de até 14 anos acontece dentro das próprias casas. Apesar do alto número, especialistas acreditam que esta seja apenas a ponta do iceberg.
“A subnotificação é um grande desafio, impedindo uma compreensão mais precisa da real dimensão do problema, e, especialmente, a interrupção da violência e o tratamento de seus danos, físicos e psíquicos”, afirma o presidente da SBP, Clóvis Francisco Constantino.
Ele explica que, como na maioria dos casos a violência ocorre dentro de casa, as vítimas se tornam reféns de seus agressores.
“Os agressores, homens e mulheres, vão evitar ao máximo levar a criança ou adolescente para atendimento médico, mas, quando o fazem pela gravidade das lesões, criam histórias de ‘acidentes’ para encobrir suas violências. Em áreas remotas ou com poucos recursos, a notificação e o tratamento e a proteção das vítimas ainda é menor”, observa.
Em Santa Catarina, 31% dos episódios de violência física envolvem crianças com menos de 10 anos.
A notificação de qualquer suspeita ou confirmação de violência contra crianças e adolescentes no Brasil é obrigatória, conforme estabelecido pelo Ministério da Saúde e exigido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Todos os casos devem ser denunciados ao Conselho Tutelar, mesmo quando há apenas suspeita. Em situações mais graves ou que envolvem crimes como violência física, psicológica ou sexual, as delegacias de polícia e o Ministério Público também precisam ser notificados.
Orientações
“É fundamental que os profissionais de saúde estejam atentos e sensíveis aos sinais de violência. Fraturas inexplicáveis ou específicas de traumas intencionais, relatos contraditórios ou lesões incompatíveis com o trauma descrito, ou com o desenvolvimento psicomotor da criança, são indicativos claros de que a criança ou adolescente precisa de maior avaliação, diagnóstico, tratamento e, proteção imediata”, alerta Luci Pfeiffer, presidente do Departamento Científico de Prevenção e Enfrentamento das Causas Externas na Infância e Adolescência da SBP.
A violência intrafamiliar — ou seja, dentro das próprias famílias — é a forma dominante de agressões, e para a médica é uma “doença crônica”, que passa de geração em geração e não distingue classe sociocultural ou etnia, por exemplo.
Congresso em Florianópolis
O tema violência foi assunto do 41º Congresso Brasileiro de Pediatria, que este ano foi realizado em Florianópolis, até sábado (26). Depois do evento, uma nova campanha de sensibilização e orientação diagnóstica da SBP será implementada em todo o país. O objetivo é aumentar as ações de prevenção e identificar precocemente os sinais de violência em todos os níveis de serviços de saúde.